Serão a língua e o paladar os novos clitóris?
- Giovana Goldman
- 3 de jan. de 2022
- 2 min de leitura
Uma das coisas mais importantes que aprendi em todo esse tempo de estudos sobre nutrição não tem nada a ver com comida. Tem a ver com feminismo.
As mulheres foram oprimidas e reprimidas em vários aspectos da sua natureza. Por muito tempo, foi a sexualidade. Hoje, é a forma de comer e a forma do corpo.
Estar “fit” se tornou uma exigência social e para isso é necessário estar hiper-vigilantes com a alimentação. Contar calorias, carboidratos, gorduras, proteínas. Não isso, não aquilo. Tudo engorda ou faz mal à saúde.
Nem passando por uma pandemia que nos deixou dentro de casa praticamente dois anos, a gente foi liberada para comer o que tem vontade. Mesmo vivendo um stress coletivo como há muito tempo não vivíamos, ainda assim o controle sobre o que comemos está em todos os lugares. Frases como “engordei muito na pandemia” são o pão nosso de cada dia. Ops! Pão não pode, perdão.
Serão a língua e o paladar os novos clitóris? Será o prazer que vem da boca o novo proibido?
Para que a sociedade nos aceite, precisamos ter um corpo de determinada forma e, para atingi-lo, é necessário MUITO SACRIFÍCIO. Como foi, em sua época, o sacrifício da virgindade. O hímen era a porta trancada para o mundo do prazer, assim como hoje, a boca é a porta lacrada, tudo em prol do corpo ideal.
Comer um chocolate virou crime. Só pode o 70% cacao. Se tomar álcool em um dia, no dia seguinte tem que colocar o zíper na boca, o novo cinto de castidade. Comer massa no jantar é proibido. Comer pizza é um atentado ao pudor. A linguagem da alimentação hoje é a linguagem dos tabus sexuais dos séculos anteriores.
Não podemos comer. Não podemos sentir prazer com a comida. Não podemos comer quando estamos felizes, nem tristes, nem ansiosas, nem estressadas. O comer emocional também está condenado.
E agora? Será preciso queimar em público as balanças, as fitas métricas, os adipômetros, e manifestar a nossa brutal oposição a todas as regras que restringem a alimentação, para conseguir que a sociedade e os meios de comunicação parem de nos obrigar a abdicar da comida?
Ou será que vamos precisar queimar nossas línguas?

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